À conversa com o Eng.º João Loureiro
À conversa com o Eng.º João Loureiro
'Existe em Lisboa um espaço singular que tem o intuito de divulgar a arte contemporânea e fazê-la chegar a mais pessoas.'
O que é o Gabinete e quais os objetivos?
O Gabinete tem como propósito o comércio de múltiplos de arte, dando dignidade a essas peças que, ao longo dos anos, têm sido um pouco maltratadas, com edições de centenas de exemplares. O que pretendemos é fazer a diferença nessa matéria, trabalhar com edições de poucos exemplares. Queremos também tornar a arte mais próxima das pessoas, porque há muitas pessoas que gostariam de comprar, pontualmente, uma peça, ou até fazer uma coleção, mas não podem comprar peças únicas. O que temos no Gabinete são múltiplos em edições pequenas. Estamos vocacionados para a arte contemporânea nacional, temos os principais artistas portugueses, e gostaríamos – e iremos seguramente – alargar o leque a artistas estrangeiros. Estamos ainda a fazer edições próprias.
Que edições já fizeram e quais se seguem?
A edição inaugural foi com o Jorge Molder, foram seis exemplares de uma fotografia impressa em papel de arroz. A segunda edição foi um acrónimo da palavra “arte”, em bronze, do Francisco Tropa, que tem tido uma excelente aceitação. E a terceira foi uma edição da Fernanda Fragateiro, associada ao evento Bairro das Artes, que se realizou dia 17 de Setembro. É uma edição de nove exemplares, o primeiro múltiplo escultórico que a artista produziu. Em Outubro vamos fazer uma edição do Rui Toscano, em Novembro com o André Cepeda e em Dezembro será com o João Queiroz. Teremos também, em breve, algumas obras de Helena Almeida e tencionamos aumentar o acervo de livros de artista.
De onde partiu a ideia de criar este espaço?
Este projeto envolve, além de mim, dois grandes amigos, o Delfim Sardo e o Rui Abreu Dantas. O Delfim Sardo é uma referência da arte contemporânea em Portugal, e não só. É professor universitário, curador e crítico de arte. O Rui Abreu Dantas está também ligado à arte, é museólogo, trabalha no Instituto de Macau. Eu sou engenheiro civil, tenho muito gosto por esta área e acompanho arte contemporânea há muitos anos. Esta ideia surgiu há algum tempo, foi amadurecendo em conversas, e em outubro do ano passado decidimos avançar. Constituímos a sociedade, procurámos um espaço e tivemos a sorte de encontrar este, que considero muito interessante, pela localização e pela luz que tem, que ajuda as peças que estão expostas a terem uma expressão ainda maior. Inaugurámos no final de março. Não somos uma galeria, não queremos concorrer com galerias, temos uma excelente relação com elas, algumas até nos têm apoiado imenso.
Qual é o público-alvo?
O que pretendemos é chegar a muitas pessoas. Temos um público natural, que nos tem visitado imenso, que são os colecionadores, pessoas com gosto pela arte, artistas que querem comprar obras de outros artistas, mas também o público que, às vezes, tem alguma inibição em aproximar-se das galerias de arte, porque teme o valor das obras. Aqui, temos peças para todos os preços, desde pequenas dezenas de euros até dezenas de milhares de euros. Têm entrado também muitos estrangeiros, alguns por curiosidade, outros até ficaram clientes. Brasileiros e franceses, sobretudo. É também um objetivo divulgar o nosso projeto noutras cidades europeias. Lisboa não tinha um espaço como este, mas noutras capitais europeias existem locais assim. Ainda há pouco tempo tivemos um cliente que nos pediu uma peça específica do Julião Sarmento e que encontrámos na Alemanha. Esta dinâmica é também algo que nos interessa.
Que artistas estão presentes no espaço e como os selecionam?
Temos vários artistas de renome na galeria. Para além dos que já mencionei – Jorge Molder, Francisco Tropa e Fernanda Fragateiro – temos obras do Julião Sarmento, do João Louro (que representou Portugal na Bienal de Veneza deste ano), do José Pedro Croft, do Pedro Falcão, do João Onofre, do Hugo de Almeida Pinho, do Daniel Malhão, da Ângela Ferreira, da Ana Romana, entre outros. Cabe ao meu sócio Delfim Sardo a tarefa de seleção, porque ele é o diretor artístico do espaço. É ele que escolhe os artistas de acordo com o entendimento que tem do seu valor. É esse o critério. Já aconteceu artistas proporem os seus trabalhos, e também há artistas que nunca trabalharam os múltiplos de arte e que são desafiados a fazê-lo. O João Queiroz, por exemplo, vai fazer um múltiplo pela primeira vez. Será uma pequena edição em gravura, especialmente para o nosso espaço. Mas temos também projetos em preparação com a Gabriela Albergaria, com o Ricardo Jacinto, para além de projetos expositivos em desenvolvimento. Há também uma tónica na arquitetura, com projetos em desenvolvimento com Manuel Mateus e João Luís Carrilho da Graça, dois dos mais importantes arquitetos portugueses.
Que ideias têm para o futuro?
A partir do próximo ano, queremos trabalhar junto das empresas, dos decoradores e dos arquitetos. Podemos ser parceiros junto dos seus clientes, em projetos de decoração esteticamente exigentes. É um mercado que não está suficientemente desenvolvido mas muitas pessoas gostariam de poder ter acessoa este tipo de peças. Acreditamos que esta é uma óptima porta de entrada no universo do colecionismo. Repare-se que estamos a falar de obras originais, editadas em múltiplo. Frequentemente os artistas dão enorme importância a esta dimensão do seu trabalho, que lhes merece grande atenção. São objetos e imagens muito preciosos.
Esta entrevista é parte integrante da Revista Artes & Letras #68, de outubro de 2015
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