01.11.2014

À conversa com Arq.º Tiago Silva Dias

01.11.2014

À conversa com Arq.º Tiago Silva Dias

‘As áreas de actuação da profissão expandiram-se. A minha geração só queria projectar. Hoje há arquitectos a actuar noutras vertentes, o que é positivo.’

Fundou a SILVA DIAS – arquitectos com o arquitecto Francisco da Silva Dias. Como foi trabalhar com o seu pai?

Este é um atelier familiar, teve um percurso muito comum, uma passagem geracional. Comecei a trabalhar com o meu pai, depois as coisas evoluíram, o meu pai deixou de ter atividade, em termos de atelier, há uns anos, e neste momento eu sou o único sócio. No entanto, estas questões geracionais têm o seu lado positivo e negativo, como todas as empresas familiares e, portanto, em termos de posicionamento, eu não me considero um sucessor. O percurso profissional do meu pai é completamente diferente do meu, aprendi muito com ele, naturalmente, mas segui um caminho diferente, tenho um percurso individual, mais do que uma continuidade do trabalho dele. Muitas vezes é difícil separar as questões profissionais das pessoais, por isso, mesmo quando partilhávamos o espaço, eu autonomizei-me muito cedo. Até porque tínhamos diferentes áreas de actuação, métodos de trabalho, de concepção e, inclusivamente, clientes.

O seu trabalho é muito diferente hoje?

É bastante diferente, o tipo de trabalho evoluiu muito, desde 2008 ou 2009. Há dez anos havia uma percentagem de obra nova muito grande e a área da reabilitação era quase residual. Isso inverteu-se completamente. De obra nova tenho, neste momento, apenas pequenos projectos, os maiores estão parados. Tenho, em mãos, alguns projetos ligados à saúde e ao turismo em S. Tomé e Príncipe, onde temos um parceiro local. Em Portugal, que é onde temos o grosso do trabalho, fazemos muita reabilitação e intervenção em zonas históricas, um misto de destino e de vocação, e temos também muitas intervenções na área do turismo, o que nos fez, até agora, ter alguma capacidade de resistência. São duas áreas que sofreram menos.

O que é que mudou na arquitectura em Portugal, desde que começou a trabalhar?

A arquitectura esteve muito na moda, saíram muitos arquitectos das faculdades, o que fez com que a crise tenha tido maior impacto, porque não havia capacidade de absorção de tantos formados na profissão; no entanto, houve um factor que me parece positivo: as áreas de actuação da profissão expandiram-se muito. Hoje vemos, por exemplo, muitos arquitectos a actuar na área da fiscalização e na gestão de património imobiliário. São áreas de actuação que agora fazem parte da profissão. A minha geração estava mal habituada, nós só queríamos projectar. Neste momento, os profissionais já encaram outras vertentes com naturalidade e adaptam-se facilmente. Quando eu comecei a trabalhar também não havia directores de obra arquitectos, eram só engenheiros. Actualmente já há, e é positivo, porque partilhamos a mesma gramática.

E com a BETAR também fala a mesma língua?

Sim. Temo-nos entendido muito bem, tenho trabalhado com a BETAR sobretudo na área da reabilitação, em projectos com alguma complexidade, como a antiga residência do embaixador do Reino Unido, uma unidade hoteleira na Rua do Ouro e numa intervenção de especial dificuldade na ala nascente do Terreiro do Paço, em que a BETAR interveio de uma forma muito rigorosa e competente.

E o que mudou ao nível da divulgação e da ligação com os clientes?

A projecção do lado mediático da arquitectura também mudou radicalmente nos últimos anos. Antigamente era uma espécie de sistema de castas, muito hermético, que criava alguns constrangimentos na própria divulgação da arquitectura; havia um certo desequilíbrio entre correntes estéticas e de pensamento. A internet veio alterar completamente esta realidade. Neste momento eu recebo quatro ou cinco newsletters diárias de arquitectura e todos os dias me espanto como é possível todos dias serem divulgadas obras com tanta qualidade. Perdeu-se um pouco o lado sensorial do papel, mas veio democratizar completamente a divulgação da arquitectura. Foi uma transformação radical. Primeiro, o star system foi enrolado neste movimento, uma pessoa acede a sites de divulgação de arquitectura e vê as grandes estrelas mundiais ao lado de arquitectos anónimos, e com o mesmo destaque. A divulgação passou a ser global. Por outro lado, essa revolução não se reflete propriamente no trabalho, ou seja, nas encomendas. A divulgação é importante, é mais fácil, mas é também muito mais pulverizada e julgo que a angariação de trabalho faz-se pelas mesmas vias, ninguém tem trabalho só porque apareceu num ou noutro site. É estimulante mas não tem reflexo na encomenda. O trabalho continua a vir pelas vias tradicionais, é fundamental conhecer pessoas, ser credível, ter trabalhado num programa semelhante, as áreas de atuação geográfica são, também, muito importantes…

Em relação ao Pátio da Galé, um dos seus projectos mais conhecidos, afirmou ter sentido o peso por intervir num monumento nacional. Fale-nos disso.

O Pátio da Galé foi um desafio muito importante. Durante o projecto havia sempre a personagem do Eugénio dos Santos a pairar sobre mim. Quando ele elaborou o plano de reconstrução da Baixa Pombalina tinha mais ou menos a idade que eu tinha quando fiz o projecto de reabilitação do Pátio da Galé, portanto a presença dele era muito forte e a minha responsabilidade sobre esse sítio era enorme. Era um espaço muito mal tratado, que servia de parque de estacionamento, onde tinham sido feitas inúmeras barbaridades… O que fizemos foi devolver o Pátio da Galé à cidade. Reabilitámos o conjunto com a particularidade de toda a intervenção ser reversível, ou seja, todos os elementos construídos podem ser removidos, o que permite fazer regressar, até onde hoje possível, o edifício ao estado que teria após a sua construção. E é especialmente gratificante saber que, em termos de uso, tem sido um sucesso.

Quais são, no seu entender, as responsabilidades da arquitectura nos centros históricos?

Os centros históricos têm capacidades para albergar novos usos e funções, e de captar novos habitantes que não têm, necessariamente, de ser de origem de vivências alternativas ou sofisticadas, como até há pouco tempo se pensava. O próprio edificado, quando tem qualidade, tem a capacidade de se regenerar e de conter as exigências atuais do habitar, desde que a legislação permita que haja investimentos equilibrados. Houve uma altura em que as exigências regulamentares para a reabilitação tornavam inviáveis a maior parte dos projectos. Essa questão está a ser ultrapassada. Outra coisa muito importante que está a ser feita é o conjunto de operações de requalificação dos espaços públicos, que são indutores de outro tipo de requalificação: por um lado faz com que haja maior apropriação afetiva das populações sobre os locais onde habitam, por outro, são impulsionadores de novos investimentos e são operações necessárias que trazem melhorias ao nível do urbanismo comercial, que é um motor importantíssimo da dinâmica dos bairros históricos.

Esta entrevista é parte integrante da Revista Artes & Letras  #58,  de Novembro de 2014

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