01.10.2019

À conversa com Arq.º Paulo Tormenta Pinto

01.10.2019

À conversa com Arq.º Paulo Tormenta Pinto

‘Temos uma preocupação com as ‘invariáveis’ da arquitetura, uma procura por soluções sem tempo que nos remetam para um papel mais anónimo, sem que isso queira dizer perda de erudição disciplinar’

Para além do doutoramento, é Investigador no Centro de Estudos sobre a Mudança Socioeconómica e o Território e dá aulas no ISCTE. Fale-nos do seu percurso.

Terminei a licenciatura em 1993. Dois anos depois, tive a oportunidade fazer o master La Cultura de La Metropolis, em Barcelona, coordenado por Ignasi de Solà-Morales, um curso que tinha muito prestígio. Foi uma oportunidade incrível para ver Barcelona depois dos investimentos para os Jogos Olímpicos de 1992. Concluí o master em 1996. Em 2000 regressei a Barcelona para fazer o doutoramento, que defendi em 2004. Este investimento académico foi quase sempre articulado com as minhas actividades de professor e de arquitecto, pois mantenho actividade profissional regular desde 1994. Os projectos de investigação resultam deste processo, ou seja, da curiosidade sobre temas e assuntos que se afiguram pertinentes num determinado momento. Neste momento, coordeno como investigador responsável, no DINÂMIA/ CET-IUL, o projecto: “Grandes Trabalhos – Operações Arquitectónicas e Urbanísticas depois da Exposição Mundial de Lisboa de 1998”.

Que conselhos práticos dá aos seus alunos acerca da prática actual da arquitectura? A legislação é adequada?

A Arquitectura abre portas para um mundo fascinante. É um instrumento de leitura e descodificação do espaço e do tempo e também de operação sobre a mudança, no momento presente. Qualquer que seja o cenário, ou a contemporaneidade, a Arquitectura tem sempre ferramentas para se afirmar, permitindo aos arquitectos participarem nos vários contextos conjunturais – quer seja a carência de habitação, o ambiente, a requalificação do espaço público, ou a experimentação das velhas e novas tecnologias. Neste sentido a legislação é sempre vista como mais uma condicionante. Não devem ser esquecidas as lutas e reivindicações mais recorrentes dos arquitectos em torno da regulação profissional, o que implica a valorização do trabalho, a inversão da dispersão regulamentar, ou o reconhecimento das mais-valias económicas e sociais do trabalho dos arquitectos. Os melhores conselhos que se podem dar a quem quer ser arquitecto passam por estimular a seriedade e o empenho profissional, a curiosidade e o gosto pela cultura arquitectónica.

Foi arquitecto do Dep. de Construção de Habitação da Câmara Municipal de Lisboa e tem obras de habitação social. Essa vertente está sempre na base das suas propostas?

A arquitectura é sempre uma actividade social. Naturalmente que ao nível dos programas de habitação social se sublinha com maior visibilidade esta vertente, uma vez que se opera sobre a emergência da resolução de direitos fundamentais, consagrados pela Constituição. O trabalho ao nível da habitação social obriga a uma abordagem com recursos limitados, implicando soluções muito objectivas e com grande resiliência, pois normalmente os recursos ao nível da manutenção são escassos. Existe uma grande cultura aquitânica em torno dos programas de habitação social, em Portugal, onde os mestres contemporâneos se afirmaram internacionalmente com programas deste tipo. Como é o exemplo de Siza Vieira, Vítor Figueiredo ou Gonçalo Byrne.

Em 2004 criou em Lisboa a Domitianus com a arq. Rosa Maria Bastos. Porquê associar um atelier de arquitectura a uma livraria especializada em conservação e restauro?

A Rosa tinha acabado de chegar de Roma onde havia estudado, na La Spienza, Restauro e Conservação, com o Prof. Giorgio Croci. Achámos que o atelier de arquitectura poderia abrir-se para fora, sobre um tema pertinente que, em 2004, se falava ainda pouco. A livraria acabou por não resistir à chegada das grandes superfícies livreiras, mas o período de dois anos em que as duas vertentes da Domitianus coabitaram foi muito interessante e participámos em encontros dedicados às temáticas da conservação e restauro, em paralelo com os projectos do atelier.

Fale-nos do seu estilo arquitectónico.

A consciência estilística é um processo sempre difícil para os arquitectos, que normalmente se deixam enredar de modo pragmático com os programas que têm de resolver. No nosso caso existe uma preocupação recorrente com as ‘invariáveis’ da arquitectura, ou seja, uma procura por soluções sem tempo, que remetam os arquitectos para um papel mais anónimo, sem que isso queira dizer perda de erudição disciplinar. Existe sempre uma vontade de ancorar os novos projectos à cultura aquitânica. Destes pressupostos, possivelmente, resulta numa arquitectura despojada que é lida como limpa e clara, que é algo que nos agrada.

O seu trabalho tem tido referências em publicações da especialidade e tem projectos premiados. Como encara estes reconhecimentos?

O reconhecimento é um estímulo para continuar. Sobretudo permite manter um diálogo com pares. Possibilita também fazer balanços percepcionando o modo como os projectos são recebidos. Quando um trabalho é reconhecido, ou premiado, ficamos crentes que os nossos pressupostos foram apreendidos fora do casulo onde trabalhamos e isso é algo que nos deixa com mais confiança.

Esta entrevista é parte integrante da Revista Artes & Letras #112, de Outubro de 2019

 

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