01.03.2022

À conversa com Arq.º Paulo Perloiro

01.03.2022

À conversa com Arq.º Paulo Perloiro

'A profissão de arquiteto começou no dia do primeiro trabalho da faculdade [...] O atelier era um lugar de convívio intelectual e de discussão... durante alguns anos, foi uma espécie de internato de arquitetura... uma casa-atelier'

Como começou o interesse pela arquitetura?

O meu interesse pela arquitetura começa ainda em criança, um interesse inconsciente, baseado na realidade construtiva dos edifícios que uma criança consegue apreender. Interesse que foi evoluindo das construções à escala do brinquedo para a construção real de espaços lúdicos como a casa na árvore ou o abrigo do grupo. Na adolescência essa dimensão da construção foi-se tornando mais consciente à medida que passei a ter contacto com as obras reais, através de visitas que fazia com o meu pai (engenheiro civil). Foi nesta fase que percorri as obras da 2ª circular, Praça de Espanha, Ponte de Foz Côa, Ponte do Ardila e muitas outras. A dimensão das obras e dos estaleiros representavam uma mudança de escala em relação à casa na árvore. A sua materialidade teve, nesta fase, um efeito aglutinador de experiências: a descoberta da dimensão do território, a topografia do local, a geologia e os fosseis, a magia da composição do betão armado, a cofragem, a obra construída. A influência do meu pai foi determinante nesta tomada de consciência. Sempre olhei para a construção mais pelo lado do desenho do que pelo lado da técnica e, tendo estudado história de arte no secundário, acabei por descobrir a arquitetura enquanto disciplina. A profissão de arquiteto começou no dia do primeiro trabalho da faculdade.

Como é que 4 jovens arquitetos decidem fundar um atelier?

O atelier começou por ser um espaço de trabalho para o desenvolvimento dos projetos académicos. Era, antes de mais, um lugar de convívio intelectual e de discussão sobre arquitetura. Uma experiência de tal forma abrangente que, durante alguns anos, foi simultaneamente o local onde vivíamos, uma espécie de internato de arquitetura onde, longe das famílias, tínhamos uma imersão total nos temas da arquitetura. Nessa casa-atelier aconteciam discussões entre estudantes de arquitetura mas também tertúlias alargadas a outros temas e com outros intervenientes. Neste atelier foram feitos os trabalhos de curso e os primeiros trabalhos profissionais, sem ser possível determinar onde acabavam uns e começavam outros. Foi neste convívio integral de casa-atelier que o PROMONTORIO se formou.

Como surgiu a área do retail no seu percurso?

Um ano depois de terminar o curso fui convidado, por um colega mais velho, a integrar a equipa da Sonae Imobiliária. Foi aí que trabalhei no projeto do Colombo e conheci a área de retail. Tratava-se de uma tipologia de projeto desprezada pela generalidade dos arquitetos e isso despertou a minha curiosidade. Contactei com arquitetos de retail de todos os países e de todos os mercados e aprendi a identificar os fatores de sucesso e de fracasso. Nessa altura, o PROMONTORIO, enquanto atelier, fazia o seu caminho paralelo a estas experiências profissionais dos sócios e, uma vez adquirido o conhecimento sobre retail, estávamos aptos a trabalhar nesta área. Foi neste contexto que trabalhei nos projetos do Vasco da Gama, Ubbo, Guarda, Ovar, Norte Shopping, Algarve, e num sem número de shoppings no Médio Oriente.

Quais as principais diferenças e o que mais ganhou com essas experiências no estrangeiro?

As principais diferenças no desenvolvimento dos projetos entre a Europa e o Médio Oriente são sobretudo culturais. O modo como olhamos para a arquitetura e para o urbanismo são radicalmente diferentes. Os povos do Médio Oriente romperam, mais do que quaisquer outros, com as suas raízes e as suas tradições, e os edifícios são sobretudo expressão individual de um status social. Neste contexto a integração urbana e o cuidado com o espaço público são irrelevantes. No Médio Oriente a inexistência de um business plan para o investimento torna-se um obstáculo para o projeto, uma vez que não há uma necessidade calculada de retorno. Os projetos acabam por depender mais de caprichos individuais do que de decisões racionais de investimento. Outra grande dificuldade foi encontrar consultores de engenharia tecnicamente competentes. O mundo está repleto de engenheiros curandeiros e de professores Karamba. Ao fim de várias experiências frustradas acabámos por encontrar, no Líbano, uma equipa de engenharia competente e séria.

Por falar de engenheiros, a BETAR tem sido uma parceira à altura?

A BETAR tem sido um parceiro muito importante para o PROMONTORIO sobretudo porque os seus engenheiros compreendem a necessidade de pensar cada projeto como se fosse único. Ajudam-nos a procurar soluções específicas, baseadas nos princípios da engenharia, e não em receitas genéricas de “misturar com água e tomar depois das refeições”!

Qual a sua opinião sobre a questão da sustentabilidade?

A sustentabilidade tem que ser intrínseca ao desenho arquitetónico, tem que fazer parte estruturante da construção e não deve depender de sistemas tecnológicos que se tornam obsoletos à passagem de cada década. A legislação que respeita à sustentabilidade foca-se sobretudo em aspetos extrínsecos à arquitetura e à própria construção. Recomendações que são interpretadas como proibições pelas entidades e um emaranhado de regulamentos contraditórios entre si e, muitas vezes, contrários aos princípios da sustentabilidade.

Esta entrevista é parte integrante da Revista Artes & Letras #139, de Março de 2022 

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