01.04.2021

À conversa com Arq.ª Helena Botelho

01.04.2021

À conversa com Arq.ª Helena Botelho

‘Existem momentos em que temos que pensar de que forma podemos contribuir para a nossa sociedade e profissão. [Na Ordem dos Arquitectos] temos uma visão crítica e a oportunidade de pôr em prática um conjunto de reflexões’

É arquitecta, professora e curadora. Vamos por partes: porque escolheu arquitectura? 

Em primeiro lugar gostaria de agradecer o vosso convite. É com muito gosto que partilho o meu percurso, que tem sido muito acompanhado pela Betar em particular pelo Eng. Miguel Villar, com quem gosto muito de trabalhar e tenho aprendido muito. Em relação à pergunta, foi um misto de várias coisas. Tenho imagens vagas de alguns projectos que marcaram a minha infância: O Liceu de Beja do Cristino da Silva, o Hospital de Beja do Chorão Ramalho, e em particular o clube dos oficiais do Keil do Amaral… Foram sítios que despertaram a minha atenção para a importância do espaço qualificado, o modo como a luz o transforma, as formas dos edifícios que desenham as cidades. Em criança passava horas a fazer maquetes de cartolina, inventando espaços para bonecas de papel. Lembro-me de ter feito uns testes psicotécnicos no secundário, que recomendavam o direito e a psicologia em primeiro e depois as artes. Fiquei meio baralhada. A minha mãe relembrou-me outro dia que eu tinha medo de não conseguir entrar em Arquitectura e que iria para engenharia civil. Mas ela disse que não deveria desistir dos meus sonhos. Conselhos sábios! Ainda hoje os meus colegas brincam comigo porque fui com a minha mãe fazer o exame de acesso à Universidade Lusíada.

Fale-nos um pouco do seu percurso e experiência.

Entrei para a faculdade em 1988 e no segundo ano tive a minha primeira experiência no atelier do António Teixeira Guerra que estava a contratar estudantes para fazer uma maquete para o Castelo do Crato. Foi uma experiência incrível, partilhada com a Gabriela Gonçalves e a Cristina Appleton. No quarto ano fizemos um trabalho sobre a Avenida da Liberdade e conheci o Pedro Vieira de Almeida que, passados uns meses, ligou-me para ir trabalhar com ele. Foi um Mestre. Era uma pessoa de uma inteligência rara. Com ele aprendi a desenhar e a ter sentido crítico. Quando terminei o curso trabalhei com o José Maria Assis. Fizemos uns desenhos enormes à mão para uma exposição em Itália do Gonçalo Byrne. Colaborei ainda com o Paulo David, o Carlos Lampreia e mais tarde com o Gonçalo Byrne. Na altura os irmãos Aires Mateus tinham o atelier dentro do atelier do Gonçalo Byrne e colaborei com eles em alguns projectos. Trabalhei no “Farol do Rato” durante quatro anos, onde aprendi a trabalhar em equipa, num atelier com uma grande estrutura e projectos muito diversificados. Saí para criar um pequeno atelier com a Gabriela Gonçalves. Mais tarde comecei a dar aulas e fui construindo o meu percurso em ateliers com amigos. Tive um atelier com o Carlos Nuno Fonseca e dois designers, o “Colectivo Rua da Rosa”, onde a partilha de ideias era fortíssima e multidisciplinar. Foi nessa altura que fiz o meu primeiro projecto público a solo, a Cruz Vermelha de Évora. Foi um ponto de viragem onde consolidei conhecimento e adquiri uma maior autonomia. Partilhei ainda atelier com o Jorge Vicente e depois com o Filipe Mónica, durante 8 anos, até me aventurar no projecto de criar o meu próprio atelier. Em 2015 aceitei o desafio do Tomaz Hipólito e mudei-me para Marvila, onde estou até hoje. O Tomaz, apesar da sua formação em arquitectura, é um artista visual e tem um espaço de ateliers para artistas.  Este encontro entre as diversas expressões artísticas é particularmente feliz porque há uma atmosfera aberta à experimentação e partilha de ideias.

Que projectos tem em curso?

Actualmente tenho bastante trabalho no atelier e uma equipa maravilhosa completamente disponível para aceitar novos desafios. Acabámos há dias um concurso para Itália. Estamos a fazer um trabalho com a Betar e é muito estimulante poder experimentar programas que nem sempre são possíveis com a encomenda normal. Estamos a fazer projectos de edifícios públicos, habitação e culturais.

O que representa para si leccionar?

Leccionar significar estar sempre actualizado. É uma espécie de exercício mental permanente. A escola é um sítio de experimentação e reflexão crítica. Dou aulas há 23 anos e não me imagino sem o fazer. O contacto com os mais novos permite-nos uma liberdade criativa, que inevitavelmente contagia o trabalho do atelier e o meu modo de fazer Arquitectura.

Está também muito focada na Ordem dos Arquitectos. Quais são os maiores aliciantes e dificuldades?

É um grande desafio e uma grande honra acompanhar o arq.º Gonçalo Byrne nesta missão. Existem momentos na vida em que temos que pensar de que forma podemos contribuir para uma melhoria da qualidade da nossa sociedade e da nossa profissão. A equipa que lidero, na secção regional de Lisboa e Vale do Tejo, é muito generosa, entusiasmada e com um forte sentido de missão. Somos arquitectos com uma visão crítica, que nos ajuda a propor soluções para os diversos problemas que a profissão tem: contribuir para a afirmação da comunidade, participando nos centros de decisão, na rede de instituições públicas e privadas, numa perspectiva solidária e construtiva; lutar por uma dignificação da profissão e melhorar a qualidade da arquitectura e das cidades. Temos a oportunidade de pôr em prática um conjunto de reflexões. Obviamente este trabalho também tem que ser feito com os engenheiros, porque os problemas e as soluções a todos dizem respeito.

E qual a visão para o futuro?

Eu tenho confiança no futuro. Sei que nem sempre é fácil, mas o curso de arquitectura dá-nos uma forma de ver o mundo muito particular, ferramentas para nos reinventarmos e a possibilidade de trabalhar noutras áreas. A título pessoal aguardo com alguma ansiedade o tempo em que possamos voltar a viajar.

Esta entrevista é parte integrante da Revista Artes & Letras #129, de Abril de 2021 

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