01.12.2023

À conversa com o Arqº Alexandre Berardo

01.12.2023

À conversa com o Arqº Alexandre Berardo

'Na nossa profissão temos de ter um conhecimento muito abrangente do mundo e temos de ter mundo para conseguir fazer o que produzimos. (…)
[Infelizmente] vai continuar a não haver habitação porque o processo é demasiado moroso'

Fale-nos do seu percurso e de como define a forma de pensar e fazer arquitetura na Edgeline Arquitectos Associados?

Comecei com o Manuel Sousa Fernandes ainda estudava. Pouco depois do final do curso fui trabalhar no atelier do arq. Gonçalo Byrne que é uma escola. O nome do Gonçalo confunde-se com o próprio atelier. Oferece uma qualidade de trabalho e projeto inegáveis. O Gonçalo é dos melhores arquitetos nacionais e internacionais e tem uma capacidade incrível para dar e pouco receber. Trabalhei lá 9 anos. Depois, recebi um convite de um colega para nos juntarmos. Saí em final de 2008, com o arquiteto Byrne a pedir-me para continuar a acompanhar a obra que estava a terminar na Pousada do Palácio de Estói. Em 2009 dá-se a crise e de repente ficámos sem nada para fazer. Foi muito complicado. Só em 2011 é que as coisas voltaram a rolar. [Na Edgeline], o mais importante é ter um produto que podemos servir a um cliente onde ele se sinta perfeitamente integrado e confortável. Isso é que eu gosto.

Em que medida a Betar tem sido um parceiro à altura?

A Betar é, e será sempre, o meu parceiro preferido para fazer estabilidade. No último ano da faculdade, eu e o meu colega João Gois fizemos, com o apoio do professor Luis Manuel Pereira, um concurso para um Centro de Saúde para o qual era preciso especialidades. Através do pai do João, o Eng. Alírio Gois, falámos com o Eng. José Pedro Venâncio. Ainda não éramos arquitetos e a Betar abriu-nos a porta. Foi uma honra, porque sabíamos o peso da Betar no panorama da engenharia em Portugal. Quando fui para o atelier do arquiteto Byrne o meu primeiro trabalho foi com o Eng. Miguel Villar. Foi aí que me apercebi que ele é um engenheiro fora de série. Vê coisas que os arquitetos não conseguem ver e ajuda-nos de uma forma que não é normal. Sempre que posso, a Betar é a primeira escolha, pela experiência e pela excelente relação com a equipa. Recordo-me de projetos com o Sérgio Mártires, a Maria do Carmo, o José Pedro Ferreira… muito enriquecedores porque são pessoas de confiança, resilientes e perseverantes como nós e que querem fazer as coisas como deve ser.

A par da arquitetura, tem tido outras atividades. O que é que o move?

Apesar de amar o que faço, não podemos ficar centrados só no que fazemos profissionalmente. Uma “outra vida” ajuda-nos a definir o percurso como arquitetos. Na nossa profissão temos de ter um conhecimento muito abrangente do mundo e temos de ter mundo para conseguir fazer o que produzimos. Por volta dos 30 anos, organizei um Ciclo de Conferências na sede da Ordem dos Arquitetos, com o João Gois e o Pedro Sousa, onde convidávamos um arquiteto todos os meses. Na Universidade Sénior de Setúbal, convidaram-me para lecionar História da Arte, mas claro que passei aquilo para História da Arquitetura. Aquelas pessoas tinham uma suprema vontade de aprender, em vez de ficar em casa, e havia muita curiosidade em perceber a arquitetura contemporânea. Mesmo aqui, no atelier, tenho de explicar a alguns clientes que não podemos abdicar da nossa época, porque o nosso tempo um dia vai ser História. As nossas casas têm de ser do tempo dos nossos telemóveis e carros cheios de tecnologia. Recentemente fiz parte do Conselho de Disciplina Nacional da Ordem dos Arquitectos. É muito importante que os arquitetos participem mais na vida da Ordem, candidatando-se, apresentando propostas, indo a congressos… O objetivo é garantir a boa arquitetura para os cidadãos e é preciso perceber como funciona. Somos uma classe introvertida, não comunicamos bem com a sociedade. Foi feito um caminho de respeitabilidade da nossa profissão, graças a personalidades como Álvaro Siza, Eduardo Souto Moura, João Luís Carrilho da Graça, Gonçalo Byrne… que dão visibilidade ao que fazemos, mas é preciso haver muitos profissionais, com qualidade, que intervêm no território para haver melhor habitação, melhores edifícios públicos, um espaço público qualificado…

O que é que “é urgente” mudar na Arquitetura?

Atualmente mantém-se uma fraca retribuição salarial, os honorários não correspondem ao trabalho efetuado, os preços estão esmagados…. Uma situação que tem de acabar é a disparidade de critérios entre autarquias. A quantidade de legislação é absorta e as plataformas eletrónicas e os documentos exigidos para entregar um projeto na Câmara A são diferentes da Câmara B. Isso não pode ser. Depois, o que o que mata a profissão e o investimento são os tempos de licenciamento. Não é aceitável colocar um projeto numa autarquia e esperar mais de um ano. Há pouca habitação? Claro que há, que estimulo é que é dado a investidores para construir habitação coletiva? É impossível fazer um business plan porque os prazos são incontroláveis. Vai continuar a não haver habitação porque o processo é demasiado moroso. É um contrassenso, o que se vê nos noticiários, as manifestações, as imposições do Governo, a urgência que há na habitação e depois, nos organismos, é uma lentidão e burocracia inexplicáveis. É o cenário que temos e é muito preocupante. E é uma pena. Os nossos arquitetos são bons, a arquitetura portuguesa tem sensibilidade, é muito humanizada e não estamos nada atrás do melhor que se faz na Europa…

Esta entrevista é parte integrante da Revista Artes & Letras #159, de Dezembro de 2023 

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