01.01.2021

À conversa com Eng.º Guilherme Duarte

01.01.2021

À conversa com Eng.º Guilherme Duarte

'A minha vontade é permanecer em África porque contribuir para esta mudança estrutural não tem preço. Não se trata de contar a história, mas ser parte da história'

Fale-nos um pouco do seu percurso profissional.

Sou Engenheiro Civil de formação, com especialização em Gestão de Projectos pela sede da Chevron, em Houston, nos EUA. Tenho 33 anos de experiência. Trabalhei nas principais companhias e indústrias dos sectores das telecomunicações, construção pesada, mineração, linhas ferroviárias e portos. Só em linhas ferroviárias da VALE tenho quase 15 anos de actuação, tendo ocupado posições técnicas e gestão administrativa. A minha especialidade é a gestão e implantação de projectos de capital de grande complexidade. Há três anos, aceitei o desafio para sair do Brasil, inicialmente para Moçambique, como gerente de infraestrutura e contractos do Porto de Nacala e, a partir de Setembro de 2019, assumi os projectos de alta complexidade no Malawi. Actualmente, sou responsável pelos principais contractos da Engenharia de Carga Geral da Nacala Logistics (Grupo VALE) e pela gestão dos projectos, com uma busca obstinada em criar um ambiente de trabalho livre de riscos e acidentes para as equipas. Procuro ainda fazer uma gestão ágil nas tomadas de decisões, tecnicamente robusta e assertiva, quanto ao planeamento físico-financeiro.

Quais são os maiores aliciantes e as maiores dificuldades deste desafio?

O principal valor da companhia é: “a vida em primeiro lugar!” portanto o maior desafio, e o mais motivador, é gerir, mitigar e eliminar os riscos a que estamos expostos. Refere-se a aumentar, a níveis muito elevados, os padrões de segurança, prevenção, controlo e gestão de riscos. Em termos de implantação de projectos, os desafios são sobretudo as dezenas de pontes sobre leitos secos de rios, que em período chuvoso podem encher totalmente, em minutos, e arrastar veículos e pessoas. A logística também é um grande desafio, pois quase nada é produzido no Malawi, temos de trazer tudo de fora, inclusive profissionais experientes. As vias ferroviárias estão num estado de degradação profunda, devido ao tempo de inactividade e falta de manutenção adequada. Por estarmos em África, viver uma cultura tão diferente também é desafiante. As diferenças sociais são enormes. Enfrentamos problemas peculiares e específicos, sobretudo questões culturais e de comunicação. Existe um bloqueio significativo em relação à língua, devido aos dialectos locais. Sem falar nas questões políticas, ainda há tudo o resto associado a um continente de terceiro mundo: muitas restrições em relação a prestadores de serviços, incertezas nas entregas de produtos, condições de contractos, etc..

Que projectos estão agora em curso e que efeitos directos teve a pandemia?

Estamos a reabilitar a Linha Norte, que liga o Sul do Malawi à Zâmbia, com 400km de linha ferroviária. Estamos a construir a nova Ponte de Penga Penga e a reabilitar 16 pontes no Corredor Limbe-Nkaya, com projectos de construção e reforço estrutural desenvolvidos pela BETAR. Já reabilitámos mais de 80 pontes e estamos a concluir a construção da nova ponte ferroviária sobre o Rio Shire. Em Limbe, estamos a construir um Novo Terminal de Contentores para melhorar a logística do transporte de cargas para Moçambique e Zâmbia. Some-se a tudo isto o estudo de viabilidade para aumento de carga de mais 24 pontes que está em desenvolvimento. O impacto da pandemia foi muito grave. O Governo do Malawi, ao final de Março de 2020, emitiu um comunicado a notificar que só seria permitida a continuidade de actividades e serviços de suporte à vida. Todos os projectos foram paralisados, até final de Julho. Com o tempo necessário para nova mobilização, só voltaram em Setembro. Os impactos nos cronogramas são enormes.

Como tem sido trabalhar com a BETAR?

Conheci a Betar quando estava no Porto de Nacala, em Moçambique. Tinha muitas obras em execução e, para suporte ao planeamento e controlo, chegou a equipa da BETAR. Quando cheguei ao Malawi, a BETAR já fazia a fiscalização técnica, mapeamento e monitorização dos itens de Health Safety and Environment. Acabámos por juntar a forma objectiva de gestão que eu pratico aos conceitos dessa equipa. É uma empresa cujo mindset está muito focado na qualidade técnica, sem deixar de lado a gestão do projecto, bem como a fiscalização dos aspectos de segurança. Tornou-se um grande parceiro da Nacala Logistics, no Malawi. Todos os estudos preliminares, análise de viabilidade para aumento de carga, projectos executivos e projectos de reforço estrutural das pontes, são feitos pela BETAR. Temos uma relação extremamente profissional e confiável.

O que está pensado para o futuro?

Estamos a desenvolver o já referido estudo de viabilidade para aumento de carga em mais 24 pontes na Linha Sul. E existe também um projecto do Governo do Malawi para expandir a malha ferroviária até a fronteira com a Tanzânia. Acreditamos muito no potencial de desenvolvimento do Malawi, e dos países da África Austral. A minha vontade é permanecer em África porque contribuir para esta mudança estrutural não tem preço. Não se trata de contar a história, mas ser parte da história.

Esta entrevista é parte integrante da Revista Artes & Letras #126, de Janeiro de 2021

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