01.01.2020

À conversa com Arq.º Alberto Caetano

01.01.2020

À conversa com Arq.º Alberto Caetano

‘Uma das coisas mais importantes para um arquitecto é […] ter uma noção da história da Arquitectura, porque se existe Corbusier, Mies e Siza, foi porque antes existiu Miguel Ângelo, Bramante e Borromini’

Arq.º Alberto Caetano, porquê arquitectura? Fale-nos um pouco do seu percurso.

A Arquitectura veio para mim como uma segunda escolha. A primeira foi Pintura, mas em casa dizia-se que pintura não era profissão, era para rapazes preguiçosos sem esperança no futuro, que iriam passar fome toda a vida. Na altura de escolher o curso, decidi-me por Arquitectura por ser o mais parecido para mim com pintura e além do mais as Escolas há época até funcionavam no mesmo edifício e uma grande amiga, colega de carteira da escola primária, a Carmem Lemos, tinha-se acabado de inscrever em Arquitectura. Só depois veio a paixão pela Arquitectura.

No site do atelier pode ler-se “Vivência poética do espaço + Rigor construtivo + Precisão do desenho”. Consegue descrever o seu estilo arquitectónico e influências que não dispensa?

A vivência poética dos espaços tem uma relação forte de como o arquitecto desenha a luz (natural e artificial) dos espaços que projecta e como esta consegue, ou não, revelar esses mesmos espaços através da matéria escolhida que os irá caracterizar e, deste modo, poder provocar uma vivência poética, espaço de serenidade. Tudo isto, porém depende da capacidade de cada um e da maneira de como o ocupante vai viver e ocupar o espaço. Sempre gostei de imprimir rigor nas coisas que faço, achando que é um dever de todos nós Arquitectos, imprimirmos rigor ao nosso trabalho. O rigor construtivo deveria ser uma consequência da precisão do desenho que, na realidade, infelizmente muito das vezes não acontece.

Publicou vários livros, o seu trabalho tem tido imensas referências em revistas e tem participado em exposições colectivas e individuais. Este tipo de divulgações reflecte-se na procura do seu trabalho? O que sente quando vê o seu trabalho reconhecido?

Tenho tido a sorte de ter alguns amigos que se têm interessado pelo meu trabalho e o têm publicado, bem como alguns clientes que o têm reconhecido, quando passam a habitar os espaços que lhes desenho. Uma vez uma cliente, que durante a obra estava sempre indisposta comigo e rabugenta, no final, quando foi habitar o apartamento, disse-me que nunca se tinha sentido tão bem e tão tranquila numa casa e agradeceu-me. Uma outra, que se tornou numa grande amiga, disse-me que tinha aprendido comigo a importância de um puxador numa porta e o significado de pormenor e rigor geométrico.

Que momentos destacaria da sua actividade enquanto arquitecto?

É uma pergunta difícil de responder, porque quando estou a desenvolver um trabalho, mesmo que seja desenhar uma estante, julgo que é esse o momento. No entanto, os momentos que mais destacaria na minha vida profissional foram o projecto do terraço do Lux: a remodelação interior da sua discoteca; e a Loja da Atalaia, no Cais da Pedra. Tinha um cliente de excepção, o Manuel Reis.

Em que áreas tem tido mais trabalho, o que é que estão a desenvolver no momento e qual a visão para o futuro?

Sobretudo, recuperação e interiores. Neste momento estamos a finalizar um apartamento e a recuperação de uma estrutura de múltiplos espaços numa habitação unifamiliar. A visão do futuro é difícil de prever, só quando chegar o momento. No meu escritório os meus colaboradores sabem que lançarei sinal de alerta com três meses de antecedência.

Paralelamente à actividade de projecto, leccionou na FAUTL de 1992 a 2011. O que é que reteve dessa experiência e que ensinamentos chave dava aos seus alunos?

Gostei muito da experiência de leccionar. Aprendia-se muito com os alunos, apesar de ter havido momentos de frustração. Todos os dias era um novo desafio. Era estimulante ver a transformação. Até Abril, todos os anos (eu leccionava o 1º ano) sentia uma enorme frustração, porque parecia que tudo o que tinha transmitido de conhecimentos, eles não tinham absorvido, se bem que muitos deles não sabiam porque se tinham inscrito no curso.
Mas a partir de Abril, eles pareciam florir como a Primavera e, no final, aqueles que tinham a vocação, apresentavam trabalhos fascinantes. Ensinava sobretudo que Arquitectura é um sacerdócio e que uma das coisas mais importantes para um arquitecto é aprender a ver, viajar muito, ler, visitar museus e sobretudo ter uma noção da história da Arquitectura, porque se existe Corbusier, Mies e Siza, foi porque antes existiu Miguel Ângelo, Bramante e Borromini. E que o material fundamental da Arquitectura é a luz, que lhe revela a matéria e esta os limites do espaço onde o homem habita; e sobretudo a consciência de que a Arquitectura se destina à vivência do homem.

Há alguma coisa que ainda não tenha feito e que gostasse muito de concretizar, a nível profissional? Construiu uma casa para si? Porquê?

Existem sempre muitos desejos. É normal o homem desejar, porém o meu grande desejo é poder continuar a fazer Arquitectura, mesmo que seja o acto de desenhar uma porta, mas que no final haja o prazer do resultado de quando esta for materializada. Nunca desenhei uma casa para mim, mas sempre recuperei os espaços que habitei. Existem ainda muitos espaços que ninguém olha, à espera que se olhe para eles.

Esta entrevista é parte integrante da Revista Artes & Letras #115, de Janeiro de 2020

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